Na
noite do dia 05/02/de 2015 houve uma confusão entre o bloco
carnavalesco 'da bicicletinha' e a polícia militar. Houve uma
prisão, algumas agressões físicas e os ataques, de ambos os lados,
continuaram pela internet.
Na
versão das pessoas do bloco: a viatura cortava pelo meio do bloco,
pela calçada, quando atropelou um ciclista. Esse xingou, eles,
pararam, o agrediram, lançaram bombas de efeito moral e tiros de
borracha contra os outros participantes, e efetuaram a prisão. Essa
última, está gravada.
Na
versão da polícia: Moradores ligaram reclamando da confusão gerada
pelo bloco. Quando eles chegaram para averiguar a situação, o
ciclista os agrediu jogando a bicicleta contra a viatura. Diante
disso, eles pararam e reagiram com 'força diferenciada', que seria
adequado como defendem em vídeo.
Como
sempre, não há documentação do início do acontecimento e, por
isso, é justamente nessa parte que os relatos variam. Talvez valha
dizer que, em outras situações semelhantes, já testemunhei sim
provocação desmesurada por parte dos cidadãos frente a polícia,
bem como, muitas vezes, a desmesura na violência se originou do lado
da polícia. Eu não estava lá e, portanto, não vou tentar defender
qual lado tem razão. Felizmente, nesse caso, o argumento independe
da precisão acerca da origem dos fatos.
Apenas
para desenvolver o argumento, vamos aceitar a suposição de que a
versão da polícia é mais condizente com o acontecido. Se tiver
sido esse o caso, um ciclista seminu 'agrediu' policiais armados em
uma viatura. O quadro de uma bicicleta mede por volta de 55
centímetros e pesa por volta de 3.5 kg. Uma viatura da Rotam mede
quase 6 metros e pesa mais de 2.000 quilos. As medidas são
aproximadas mas importantes.
Suponhamos
que a versão da polícia esteja correta. Ainda assim será possível
qualificar a atitude do ciclista como uma agressão dado que a
diferença no peso entre eles beira 1000%? E ainda que seja uma
agressão, justifica uma reação com 'força diferenciada'? Uma
analogia pode ajudar a pensar. Se uma criança de 5 anos der um
beliscão em um adulto de 35, seria apropriado que o adulto revidasse
com um soco? Ou mesmo com um beliscão? Isso nos leva a segunda parte
da narrativa.
Sobre
a segunda parte, documentada em vídeo, todos concordam. A polícia
reagiu com força diferenciada contra o ciclista. Mais uma vez, o
argumento da diferença de condições se aplica. Um bando de homens
treinados, uniformizados e armados contra um cidadão seminu. O
cidadão, para agredir, poderia, no máximo, falar uns palavrões e
dar uns tapas na lataria da viatura. Isso justifica a reação da
polícia? Voltemos ao caso da criança. Porque é covardia que o
adulto responda com agressão máxima à agressão mínima da
criança? Porque, com a força, na nossa sociedade, vem também a
responsabilidade de controlá-la. Isso leva ao segundo ponto da
crítica.
A
polícia se justifica como se estivesse apenas cumprindo seu trabalho
de agente defensor da sociedade. Sim, eles o são. Não é a toa que
detêm o monopólio de uso da violência para assegurar a boa
convivência entre os membros da sociedade. Isso é necessário já
que, muitas vezes, os membros têm interesses conflitantes. Um quer
pular carnaval. Outro quer dormir. Porém, esse monopólio do uso da
violência não está em favor de uma sociedade sob a lei da
reciprocidade. Policiais não são agentes de um código que
prescreve o olho por olho dente por dente (ou, nesse caso, dente por
uma arcada dentária inteira). Não, policiais são (supostamente)
profissionais treinados para intervir em situações de conflitos
para proteger, da melhor maneira possível, os interesses de todos
envolvidos. Isso inclui ( quiçá principalmente) os interesses de
quem é visto como infrator das leis.
Se
houve infração, foi mínima. Se houve ameaça de agressão, foi
mínima. A certeza, compartilhada por todos os lados, é que a reação
foi desmedida. Desse modo, independente do que desencadeou o tumulto,
a polícia teve uma postura condenável. O que muda, caso a versão
correta seja a dos ciclistas, é o nível de absurdidade, que, eu
espero, daqui pra frente, retroceda.
Ps:
Antes de ligar reclamando do barulho que realmente incomoda quem não
quer participar da festa, considere a possibilidade de estar
desencadeando acontecimentos muito mais sérios do que se imagina.
Ps:
Tentemos entender quem não quer festa e interferir o mínimo na sua
rotina. A maneira mais segura de evitar a força truculenta é
prescindir dela. Em vários casos, isso é impossível, mas, no
carnaval, é possível sim.
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